Logo du site de la revue Cultures-Kairós

Apontamentos teóricos para uma investigação antropológica da « depressão infantil » no serviço público de saúde do Brasil

Maria Fernanda Salvadori PEREIRA
septembre 2015

DOI : https://dx.doi.org/10.56698/cultureskairos.1094

Résumés   

Résumé

Cet article aborde quelques éléments épistémologiques nécessaires à l’étude de la « dépression infantile » dans le système public de santé brésilien. Cette initiative a été motivée par la relative nouveauté de ce diagnostic dans les classes populaires brésiliennes, tandis qu’il suit le mouvement de la médicalisation de l’enfance dans la société contemporaine. Cet article débute par une révision des études anthropologiques au Brésil depuis les années 70, par rapport aux enjeux des émotions et de l’expérience de la souffrance – principalement par le biais de la catégorie des « nerfs », en ouvrant des voies vers la différenciation des valeurs et conceptions particulières à certains groupes sociaux. Dans un second temps, il présente les contraintes que représente partir d’une catégorie biomédicale exposant les mécanismes spécifiques imposés par ce « système de santé ». Et par rapport à l’épidémie de troubles mentaux, on a observé comment le développement de la psychiatrie s’intègre harmonieusement aux valeurs modernes comme l’humanisme, ainsi que les modes de sociabilité et notion d’homme imposées par les techniques de gouvernement néolibérales. Enfin, on discute la place de l’enfance et du sujet en anthropologie et quelques propositions alternatives à la dichotomie « individu et société ».

Abstract

This articleseekssome  epistemologicalelements necessaryfor the study ofchildhood depression" in the brazilian health public system. This initiativewas motivated by therelative newnessof this diagnosisin brazilianpopularclasses, however it follows the movementofmedicalization of childhoodin contemporary society.This articlebeginswith a review ofanthropologicalstudies made in Brazil since the 1970’s,dealing with the issueof emotions and the experience of sufferingmainly through thecategory of “nerves”. We believe that they opened up alternative paths to understand variantvalues and distinct conceptions of the person among certainsocial groups. The second pointis to indicate some constraintsof startinga studyfrom abiomedicalcategory. The purpose was to show the specific mechanismsof this major "health system". Andregarding to the epidemicaspectsof mentaldisorders, itwas demonstrated how the psychiatrygrows harmoniously with the modernvalues such ashumanismas well asthemodes of sociabilityand the conceptions of the personimposed by the government neoliberal techniques. Finally, we discuss the place of childhood and subject in anthropology and suggestions to overcome the dichotomy "individual and society".

Resumo

Esse artigo aborda alguns elementos epistemológicos necessários para o estudo da « depressão infantil » no sistema público de saúde brasileiro. Essa iniciativa foi motivada pela relativa novidade desse diagnóstico nas classes populares brasileiras que, no entanto, segue o movimento de medicalização da infância na sociedade contemporânea. O percurso deste artigo inicia com uma revisão dos estudos antropológicos feitos no Brasil desde a década de 1970, que tratam da questão das emoções e da experiência de sofrimento – principalmente através da categoria dos « nervos », abrindo caminhos para uma visada diferenciante dos valores e concepções da pessoa de determinados grupos sociais. O segundo ponto foi levantar os constrangimentos de se iniciar um estudo a partir de uma categoria biomédica, explicitando os mecanismos específicos impostos por este « sistema de saúde ». E no que tange ao aspecto epidêmico das patologias mentais, observou-se como a psiquiatria vem se desenvolvendo harmônica aos valores modernos como a humanização, bem como aos modos de sociabilidade e à visão de homem impostas pelas técnicas neoliberais de governo. Finalmente, discute-se o lugar da infância e do sujeito na antropologia e as propostas alternativas à dicotomia « indivíduo e sociedade ».

Index   

Index de mots-clés : santé mentale, dépression infantile, anthropologie, sujet, enfance.
Index by keyword : mental health, child depression, anthropology, subject, childhood.
Índice de palavras-chaves : saúde mental, depressão infantil, antropologia, sujeito, infância.

Texte intégral   

Introdução

1A depressão que até há pouco era um diagnóstico distintivamente adulto vem sendo citada em mídias de grande circulação acerca de uma versão infantil. Estes artigos são bastante semelhantes no que reproduzem as determinações biomédicas e servem como « alertas » aos pais e professores, de que a infância, apesar de ser concebida como um período de inocência e felicidade pode ocultar casos de depressão. Especialmente pela doença se manifestar de modo diferente nessa fase da vida. As crianças depressivas não são necessariamente tristes, mas irritáveis e agressivas. E essa atenção descontextualizada ao comportamento da « criança difícil » contribui para o aumento do número de casos diagnosticados.

2Tendo como premissa ganho da importância desse diagnóstico no senso comum, o objetivo desse artigo é relacionar elementos epistemológicos necessários para o estudo da « depressão infantil » no sistema público de saúde brasileiro. Para tanto, iniciamos revisando estudos antropológicos feitos no Brasil desde a década de 70 que tinham por objeto as emoções, a experiência de sofrimento e perturbação. Estes culminam para a centralidade da classe social como um marcador da diferença e abrem a perspectiva para uma compreensão situacional da saúde mental. Um eixo paralelo consiste em tencionar a depressão como um diagnóstico biomédico. A partir da antropologia médica observa-se que as doenças mentais historicamente operam obliterando aspectos morais e sociais desvalorizados. Ou seja, implicam uma falência na adequação de valores identitários importantes de determinados grupos.

3As especificidades da experiência da perturbação e sua compreensão contextualizada, não impedem que busquemos referências sobre a da depressão enquanto uma « epidemia » moderna. Assim entendemos que o foco nos processos microssociais subjacentes a um grupo de indivíduos convivem - via assujeitamento e resignificação – com o contexto macrossocial. Este se refere principalmente aos modos de sociabilidade oriundos da racionalidade neoliberal de governo e das políticas públicas que regulam as ações no serviço de atendimento à saúde mental infanto-juvenil no Brasil.

Estudos Antropológicos em « Saúde Mental » no Contexto Urbano Brasileiro

4Em meados dos anos 70 a antropologia começa a ter publicado seus primeiros trabalhos sobre a saúde mental no Brasil. Esses estudos foram influenciados principalmente pela escola do interacionismo simbólico (mais especificamente, sob a influência de Goffman e Becker) proporcionando-nos uma análise política do cotidiano e das relações interpessoais. Sob tal ótica, o doente mental é entendido como uma « categoria de acusação », indicando um « desvio » da ordem moral mais abrangente da sociedade (Velho, 1978). Paralelamente, na sociedade brasileira, acontecia a expansão da psicanálise e do movimento antipsiquiátrico, fazendo com que o campo « psi » se tornasse objeto de indagação antropológica (Russo, 2004 ; Figueira, 1978). Nesse momento é marcante o trabalho de Castel1 que relacionava o movimento de psicologização à adoção de novos códigos num âmbito subjetivo organizado em torno da individualidade. O campo « psi », mormente influenciado pela análise do ego americana, era acusado enquanto instrumento de apolitização na sociedade (Figueira, 1978). Sobre isso, a posição de Sérvulo Figueira é que se teorize superando o grande divisor « indivíduo Vs. Sociedade » – o que Castel não faz, pensando as emoções como um objeto transdiciplinar privilegiado.

5A partir dos 80 surgem alguns estudos indicando uma variação no modo como as pessoas das classes populares experenciavam a perturbação « mental » se comparadas às das classes médias e a concepção da biomedicina (Duarte, 1986 ; Silveira, 2000 ; Maluf e Tornquist, 2010). Segundo Duarte (1986 e 2003), nas primeiras o sofrimento pessoal e a aflição tendiam a serem situados no âmbito do « nervoso », indicando uma percepção da perturbação como « fisico-moral » bem como uma « noção de pessoa » que contrastava com os princípios da ideologia do individualismo. Por outro lado o movimento de medicalização e de psiquiatriazação da medicina tem pressionado no sentido de um « deslocamento da experiência de sofrimento e aflição para o campo da saúde » (Maluf, 2010).

A Biomedicina como modelo de compreensão dos afetos

6No cenário atual do que comumente se denomina saúde mental, todo mal-estar é a-temporal e comumente generalizado para todas as sociedades. A antropologia médica tem procurado resituar a questão observando que todo « mal-estar », « transtorno », « distúrbio » se refere a um tipo de comportamento socialmente problemático ou mesmo inaceitável em diferentes culturas (Minayo, 1991). A diferença desse tipo de comportamento com aquele visto como desviante é a existência de técnicas específicas as quais são alvo. Tais técnicas também operam como um sutil « mecanismo de exculpação » na medida em que transferem a responsabilidade do comportamento para agentes que estejam além da vontade do indivíduo (Young, 1976, p. 2).

7Do ponto de vista antropológico entende-se que a « depressão », como qualquer « doença », é um modelo de compreensão dos afetos (Good, 1994). Por ser entendido como um modelo entende-se suas especificidades como historicamente estruturadas e relacionadas, seguindo diferentes e sucessivos paradigmas. Em relação ao nosso tema de estudo partimos de uma categoria biomédica e, portanto pretendemos examiná-la mais cuidadosamente. Uma das características principais da biomedicina é ser epistemologicamente centrada num determinismo biofísico. Este determinismo é um mecanismo que compõe a « forma de atenção » (Menéndez, 2003, p. 192) da biomedicina, que tem por principais propriedades :

biologismo, a-ssociabilidade, a-historicidade, a-culturalismo, individualismo, eficácia pragmática, orientação curativa, relação médico/paciente assimétrica e subordinada, exclusão do saber do paciente, profissionalização formalizada, identificação ideológica coma racionalidade científica, a saúde/enfermidade como mercadoria, tendência a medicalização dos problemas, tendência à elisão entre teoria/prática. (Menéndez, 2003, p. 194)

8A biomedicina é a forma dominante de medicina alopática nos serviços de atenção à saúde. Esse modelo é também a forma de atenção que mais se expande, inclusive em países com uma forte tradição da medicina local, como a China. Essa expansão, que conceitualmente é tida como « medicalização » resulta em um processo social onde situações vitais que fazem parte da vida cotidiana dos sujeitos são convertidas em doença (Menéndez, 2003, p. 193).

9Na psiquiatria, especificamente, observa-se o processo de medicalização ocorrendo de maneira muito potente. Sobre esse processo observamo-lo em dois tempos : num médio e num curto prazo. O que consideramos médio prazo remete à segunda metade do século XIX, período que ocorre uma virada epistemológica importante. Um dos principais atores nesse processo foi a teoria de Morel em 18572 que possibilitou a « clínica ampliada », ou seja, a psiquiatria para fora do asilo e do patológico (Caponi, 2009). Essa mudança consistiu em tomar quaisquer desvios estatísticos e anomalias como « degeneração » abrangendo toda uma série de condutas e comportamentos cotidianos.

10Num período mais recente, desde a segunda metade do século XX, observa-se a consolidação dos DSM’s (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) - de um estudo estatístico para um manual diagnóstico, voltado a diferenciar o normal do patológico. Tem-se notado que a cada revisão do manual ocorre uma progressiva expansão do mesmo, com a inclusão de novos « transtornos » e « distúrbios », assim como um afastamento total da teoria psicodinâmica original, notadamente a partir do DSM III, em 1987 (Dunker & Kyrillos Neto, 2011). Com isso ocorre a substituição de quase todos os termos indicativos de etiologia para uma classificação baseada unicamente na descrição clínica da queixa dos pacientes - a « medicina baseada em evidências » (MBE).Desse processo revisional observa-se como o manual em questão foi se tornando cada vez mais medicalizado, excluindo qualquer referencial social do âmbito da psiquiatria.

11Até aqui observamos o movimento da medicalização na psiquiatria operando seu mecanismo de fagocitose : incorporando novas tendências e assimilando-as através da aculturação e da elisão entre teoria e prática. Isso ocorre desde Morel e a inclusão de comportamentos (sociais) « degenerados » até um movimento mais recente de exclusão de quaisquer termos que remetam à esses mesmos valores sociais. Numa possível linha de fuga a esse processo, o estudo da depressão em pesquisas antropológicas tem revelado novas nuances ao demonstrar particularidades socioculturais que afetam as formas de conceber e agir em relação ao fenômeno da « saúde mental ».

12Apesar da depressão ser descrita como um fenômeno transcultural, o modo de expressão e significado é muito variado. Isso porque as emoções « são artefatos culturais », ou seja, não são construídas do mesmo modo em diferentes culturas, nem possuem os mesmos modos de expressão (Jenkins ; Kleinman & Good, 1985, p. 68). O estudo destes é abundante em exemplos que culminam na constatação de que o fenômeno é em si pouco preciso e por isso tão facilmente abrangente da diversidade das manifestações. Notadamente é o que ocorre no sul da Ásia, onde as pessoas « deprimidas » parecem não experenciar os sintomas psicológicos da depressão, como culpa e o ressentimento. Suas queixas ocorrem num vocabulário que remete à experiência do corpo : dores nas costas, na cabeça, constipação. Na biomedicina esses fenômenos seriam entendidos como « somatização », mas os autores questionam esse tipo de tradução simplista. Outro exemplo é o fenômeno dos « nervos » (Duarte, 1986), que denotam uma compreensão relacional de saúde e de pessoa e que rompe a usual divisão biomédica entre aspectos físico (somáticos) e moral. O fenômeno do « nervoso » compõe um universo simbólico que relaciona a pessoa à sua família e ao lugar. Por isso sua expressão, que varia de acordo com o gênero e a idade, denota uma falência nos valores identitários e nos princípios de complementaridade daquele grupo. No estudo « a fome, a bebida e a pancada » são apontados como índices característicos da falência deste modelo (Duarte, 1986, p. 211).

13Apesar da biomedicina ser um discurso predominante na elaboração das políticas públicas de saúde é preciso levar em conta que a assistência em « saúde mental » brasileira tem passado por um importante processo de reestruturação crítica nos últimos tempos. Essa reestruturação começa nos anos 70, quando aconteceram diversos movimentos pelos direitos dos pacientes psiquiátricos buscando denunciar a violência do « tratamento » seguido nos manicômios. Esse processo também foi fortemente influenciado pelo movimento « antipsiquiátrico » que tinha Cooper e Laing como principais teóricos, bem como pelo clima da « contracultura » que reverberou das manifestações francesas de maio de 68. Este também era um momento de emergência do mundo « psi », com a difusão da psicanálise e da psicologia na sociedade brasileira (Russo, 2004).

14A psicologização representava nesse momento uma promessa de transcendência dos constrangimentos sociais, a partir do indivíduo. Este, identificado com uma ideia de egoou de self totalizantes e autônomos, buscava seu fortalecimento para liberação das pressões oriundas de todo tipo de autoridades formais. Essa tendência contracultural pode ser notada nas explicações dadas por Cooper e Laing às causas da loucura : « Os mais básicos conflitos individuais provêm, portanto, deste choque entre determinadas aspirações pessoais (aquilo que eu quero ser) e as prescrições de papéis ditadas pela família (aquilo que eles querem que eu seja) » (Duarte Jr ,1953, p. 59). Esse discurso, embora nos pareça ingênuo, pois redutor das causas dos sofrimentos subjetivos, foi catalisador de uma experiência inovadora no tratamento dos transtornos mentais. Serviu também como denúncia (tal como exposto no filme brasileiro « Bicho de Sete Cabeças »3) de que muitos conflitos de matriz familiar serviam-se das internações psiquiátricas como forma de punição e correção de comportamentos indesejados.

15A experiência de desinstitucionalização da psiquiatria que ocorre na Itália inspira a possibilidade de uma nova proposta de atenção à saúde mental no Brasil. No período que se segue há um movimento político e social intenso, com conferências, projetos de leis e, sobretudo experiências paradigmáticas, que contribuem para a criação de uma rede descentralizada de atendimento. Assim que, nos anos 80 já observamos um processo de expansão dos atendimentos de base comunitária, que impulsionam a implantação dos NAPS (Núcleo de Atenção Psicossocial) e posteriormente dos CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) e hospitais-dia4.

16Os CAPS tem um valor estratégico na reforma psiquiátrica. Esses centros, que são de bases territoriais buscam um atendimento que substitua os manicômios, propiciando maior « autonomia » e « inserção social » do « usuário », que pode retornar à casa ao final do dia de tratamento e atividades. Os CAPS estão divididos em CAPS I (para atendimentos em municípios de menor porte- entre 20.0000 e 50.0000 habitantes), CAPS II (municípios com mais de 50.000 habitantes), CAPS III (atualmente só existem em municípios com mais de 500.000 habitantes), CAPSi (especializado no atendimento de crianças e adolescentes) e CAPSad (especializado para dependentes de álcool e drogas)5.

17O processo de reforma psiquiátrica tem sido um lugar privilegiado de debates políticos e sociais em torno da questão da saúde mental. Inclusive nos parece premente resituar os aspectos sociomorais que foram expurgados da psiquiatria, quando esta tendeu para um alinhamento ao modelo biomédico. Por outro lado, observa-se que na prática da reforma psiquiátrica, a crítica tenha pesado muito mais ao local de tratamento (de asilar para extra-asilar) do que propriamente à lógica de « tratar », « incluir », « docilizar » a « loucura » (Andrade, 2012, p. 117). Assim, na reforma psiquiátrica brasileira o tratamento medicamentoso continua sendo peça fundamental, aliado, porém a outros mais « humanizados », como a terapia ocupacional, grupal, etc.

A « Depressão » como marcador social do contemporâneo

18Na perspectiva de constituir uma história da doença « depressão », autores como Gonçalves e Machado (2007), Teixeira (2005) e Baztán (2008) defendem que ela em parte abarcou o que antes era chamado « melancolia », uma condição que remonta à Grécia antiga. Atualmente é difícil imaginar que este estado afetivo já tenha sido bastante valorizado em muitos momentos da história, denotando inteligência e profundidade à pessoa afligida. Logo percebemos que a mudança nos termos também reflete transformações epistemológicas donde um paradigma poético, filosófico, religioso e astrológico é progressivamente depurado em uma compreensão mais cientificista do mundo e das « patologias mentais ». Observamos também que a marginalização da melancolia em diferentes momentos da história ocorreu principalmente quando ela era entendida numa cosmologia que distinguia e colocava em oposição o saber e a emoção. Isso ocorre tanto na idade média, onde o estado melancólico era considerado uma aproximação da animalidade (por conta da perda do juízo) e, portanto um afastamento do sagrado (Gonçalves & Machado, 2007, p. 229); Como no racionalismo moderno, onde o poder do intelecto é o único caminho para a verdade e passa a definir a existência do indivíduo (cogito ergo sum).

19Apesar dos indicativos da depressão não ser um fenômeno completamente novo na história do ocidente, quando se lê as estatísticas da OMS se é levado a concluir que estamos vivendo uma epidemia mundial, em franco processo de expansão. No Relatório Mundial da Saúde (RMS) de 2002 dedicado ao tema da saúde mental encontramos a estimativa de que até 2020 a depressão seria a segunda doença incapacitante mais frequente no mundo. E noutro mais recente, de 2012, esta já aparece no topo das causas de incapacidade laborativa6. Estes são classificados como preocupantes, atentando para a questão de que importantes recursos sociais e econômicos estão sendo mobilizados em função desta doença.

20À parte da discutível pretensão universalizante dessas grandes agências de saúde, alguns atores tem indagado a depressão enquanto um « marcador social » da atualidade (Ehrenberg e Botbol, 2004). Essa pergunta, que se dá em termos sócio-históricos tem vieses interpretativos muito aproximados : A) o fenômeno revela uma transformação de valores, bem como uma relação com a economia neoliberal de mercado ; B) o fenômeno revela não propriamente uma transformação, mas uma mudança na hierarquia dos valores ; C) É um fenômeno indissociável da ascensão de uma ideologia individualista. Examinemos brevemente algumas dessas teorias :

21A psicanálise, principalmente a que foi consolidada com a vertente lacaniana, divide com a antropologia uma orientação não essencialista na compreensão das « doenças » afetivas7. Roudinesco (2000) e Kehl (2000) são algumas autoras dessa disciplina que têm observado que a preponderância da depressão na subjetividade contemporânea ocupa o lugar (epidêmico) que era preenchido pelo mal da « histeria », no século passado, mas despojado de seu caráter subversivo. Pois para Roudinesco :

A histeria de outrora traduzia uma contestação da ordem burguesa que passava pelo corpo das mulheres. A essa revolta significativa por conta de seus conteúdos sexuais, Freud atribuiu um valor emancipatório do qual todas as mulheres se beneficiaram. (Roudinesco, 2000, p. 25)

22 A tese dessas autoras é que essa mudança revela uma transformação nos valores de uma sociedade revolucionária, fundada sobre o « sacrifício » que se dava em prol de um ideal transcendental ; para uma neoliberal, orientada para a satisfação das necessidades individuais, de consumo e bem-estar. Neste contexto, o imperativo da felicidade coincide com as razões de mercado, e cada « indivíduo tem o direito e, portanto, o dever de não manifestar mais seu sofrimento, de não mais se entusiasmar com o menor ideal que não seja o do pacifismo ou da moral humanitária » (Roudinesco, 2000, p. 16).

23Para dar corpo ao argumento, as autoras observam uma mudança na linguagem sobre a enfermidade, onde o « conflito subjetivo » já não se assenta mais no inconsciente. Ou melhor, não há sequer a noção de conflito na linguagem da « saúde mental ». Se fala em « déficit » ou « mau funcionamento », questões que remetem a uma noção de homem entendido e gerido a partir de um « cerebralismo » (Azize, 2008) e julgado a partir de seu caráter produtivo (Farhi Neto, 2007). Há, em suma uma redução de fenômenos do espírito ao cérebro, que é entendido como o « motor da pessoa » (Ehrenberg e Botbol, 2004, p. 150).

24Em consonância com as psicanalistas citadas, Farhi Neto (2007) escreve acerca de uma biopolítica8 vigente, aplicada às técnicas liberais de governo. Assim, observa como a racionalidade neoliberal também se reflete em modos de sociabilidade ; e « técnicas do eu » - hábitos de autogestão e autoregulação - atrelados à biomedicina e seu alto valor mercadológico. Dentre essas técnicas de autogestão, Ehrenberg (2004) dá acento ao primado da « autonomia » (a decisão e ações pessoais) como valor paradigmático das sociedades contemporâneas. E de forma sutil o autor diferencia seu entendimento de que houve não uma substituição, mas uma mudança na hierarquia dos valores. Assim : « não é que a disciplina tenha desaparecido, mas ela se encontra embutida na autonomia, que lhe é superior em valor » (Ehrenberg e Botbol, 2004, p. 147).

25Sumarizando os argumentos acima, observamos que a sociabilidade neoliberal valoriza os afetos felizes ligando-os não só à concepção de sucesso pessoal, mas à noção mais fundamental de saúde. Essas sociedades também são alvo de teses que relacionam seu individualismo característico com a depressão. Esse é o argumento de Baztán (2008), que diz que a cultura « ocidental » não só tende a inibir as manifestações de infelicidade como não propicia mecanismos públicos ou comunitários para expressar esses afetos. A tese é que quando compartilhada, a dor individual se dilui, tornando-se mais branda. Sobre isso, nossa impressão é que se trate de uma tese bastante plausível mas que reduz muito a uma interpretação funcionalista do fenômeno. Sobre isso Jenkins, Kleinman e Good (1985, p. 70) acrescentam que o fato da diferença geralmente ser generalizada para diferentes tipos de self : um ocidental mais « egocentrado » e outro mais « sociocentrado » impede que se vejam as diferentes respostas em grupos sociais dentro de uma mesma cultura. Como, por exemplo, entre mulheres com « dupla jornada », imigrantes, famílias com filhos pequenos ou que experimentaram uma mudança no padrão socioeconômico. Essa visão teórico-metodológica valoriza os processos microssociais subjacentes, ao invés de uma estrutura prévia preponderante. Busca-se compreender as diversas maneiras pelas quais « indivíduos e grupos sociais vivenciam, explicitam e procuram ajuda para os problemas concretos da enfermidade » (Alves,1994, p. 99).

26Uma questão aparentemente banal, mas que contribui para a popularização da depressão é que a definição dessa doença é simplesmente vaga. Segundo o CID-10 (Classificação Internacional de Doenças- 10ͣ revisão) e o DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais – 4ª revisão), elaborados pela OMS e pela Associação Psiquiátrica Norte-Americana, respectivamente, a depressão faz parte do rol de « Transtornos de Humor ou Afetivos », e possui todo um espectro de classificações : leve, grave, intercalada com euforia, etc. No RMS a depressão é descrita como :

Sentimento de tristeza, perda de interesse nas atividades e diminuição da energia. Outros sintomas são a perda de confiança e auto-estima, o sentimento injustificado de culpa, ideias de morte e suicídio, diminuição da concentração e perturbações do sono e do apetite. Podem estar presentes também diversos sintomas somáticos.

(RMS, 2002 : 68)

27Partindo da descrição observa-se que a enfermidade inclui um amplo espectro de mal estar e os únicos fatores a diferenciar a depressão de um episódio comum de tristeza é a intensidade e a duração temporal – os sintomas devem se prolongar por mais de duas semanas consecutivas. Essa incerteza normativa é um dos empecilhos para o estudo cross-cultural da depressão. Pois o que consta acima como « sintoma » pode ter diferentes representações e padrões de expressão em diferentes culturas e contextos sociais (Jenkins ; Kleinman e Good, 1985). Outro reforçador desse diagnóstico é a valorização da linguagem da vulnerabilidade individual. Essa se tem se tornado uma espécie de língua franca da aflição, pois é um meio de categorizar e abstrair diferentes tipos de perturbações ao âmbito da « saúde mental » :

Hoje, mais e mais problemas são definidos em termos de sofrimento psíquico e suas soluções são propostas em termos de saúde mental. (...) [E] se difundem no contexto de uma medicina do bem-estar, da qualidade de vida. É um movimento que está para além da psiquiatria. Eu diria que, no fundo, nossa sociedade adotou uma nova linguagem, que é a linguagem da vulnerabilidade individual. Isto não significa que as pessoas são mais vulneráveis que antes ou que sofram mais que antes, contudo, é isto que ganha evidência quando se descrevem todos os tipos de situação. (Ehrenberg e Botbol, 2004 :151)

28Em relação às crianças, observamos que a presunção de « vulnerabilidade » tem servido para justificar uma série de políticas públicas que implicam tanto a proteção como o estímulo à resiliência (Brito, 2013, p. 274 ; Assis, 2006). A infância é entendida como uma fase vulnerável do indivíduo segundo a concepção de um período crucial do desenvolvimento do ser. Esse desenvolvimento, portanto, precisa ser zelado, e recentemente9 se depara com a possibilidade de uma nova ameaça - a depressão não tratada. Eis mais uma frente de expansão desse diagnóstico.

29A depressão que até há pouco era um diagnóstico distintivamente adulto vem sendo divulgado em mídias de grande circulação acerca de uma versão infantil. Observa-se que essa expansão do diagnóstico de depressão : de adultos para crianças - ocorreu de forma invertida no caso do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, que na sua aparição era caracteristicamente infantil (Moura, 2013). Pensamos que esses acontecimentos sejam representativos de um fenômeno de subjetivação onde ocorre uma ressignificação na ideia de desenvolvimento. Ou melhor, uma mudança de um paradigma psicológico da « mente », que entre outras coisas diferenciava qualitativamente o adulto e a criança ; para um paradigma « cerebral » que os unifica em torno de um órgão do corpo (Azize, 2008). Essa noção justifica o fato da depressão infantil não precisar de uma especificação nosográfica própria no DSM IV ou CIDX. Dentre os sintomas elencados anteriormente, à modalidade infantil adiciona-se simplesmente a improdutividade no âmbitoinfantil, o« baixo rendimento escolar » (Nakamura, 2007).

Políticas públicas e infância

30As políticas públicas, instituições e organizações profissionais tem um papel dominante em regular as sociedades contemporâneas funcionando análogas ao mito, uma vez que carregam noções e valores que são o substrato da ação social (Wedel e al, 2005). Etimologicamente a palavra « política » está relacionada com as funções de « patrulhar » e « disciplinar » (Shore, 2010, p. 30), o que significa que as políticas públicas carregam implícitos tanto uma ideia como um processo - refletindo racionalidades de governo ou governamentalidades. Esta « arte de governar » como visto em Foucault ([1979] 2014) faz parte de movimento iniciado no século XVI que consiste numa série de táticas e prescrições na administração e economia de esferas que vão desde a própria subjetividade, a família, até o nível mais geral da população e dos territórios. Essas esferas individualizadoras e totalizantes que constituem o poder estatal frequentemente estão ocultas numa linguagem objetiva (Wedel e al, 2005).

31A política frequentemente é vista como algo lógico e ordenado, pois é norteada por um modelo abstrato. Entretanto na prática « (...) encontram variáveis imprevistas, as quais são combinadas com técnicas e consequências igualmente imprevistas » (Wedel e al, 2005, p. 38). A antropologia tem ferramentas para rastrear esses processos centrando sua análise no modo como os atores mediam diferentes variáveis. Um breve exemplo relacionado ao tema proposto é uma pista do modo como se criam estatísticas sobre a depressão infantil no Brasil. Conversando com uma psicóloga e uma enfermeira do CAPSi da cidade de Florianópolis, estas revelam ser difícil que as crianças se « encaixem » na descrição nosológica formal, pois era comum na observação diagnóstica uma « mistura de vários distúrbios ». Entretanto a criança deveria estar vinculada a algum « transtorno » específico para serem lançadas no sistema de computador. Isso nos dá a entender que existem técnicas para hierarquizar e selecionar uma única classificação, mas que esse processo é parte de um dilema imprevisto.

32Shore (2010) e Minayo (1991) propõem que o antropólogo deve estudar tanto aqueles que elaboram e implementam as políticas (que agem em nome do Estado), como àqueles que são alvos das mesmas ; o modo como as experenciam ; quais os efeitos sociais, consequências inesperadas ; de que maneiras os sentidos são criados. Isso envolve uma « etnografia multilocal » (Shore, 2010, p. 33), pois explora a relação entre atores globais e locais. Wedel e al (2005 : 39) também sugere « studying through », ou seja, rastrear as conexões entre diferentes atores e esferas de atuação, observando como indivíduos, organizações e instituições estão interconectadas e os modo como os discursos políticos ajudam a sustentar essas conexões.

33Em relação à estipulação normativa do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) (Brasil) a criança é uma pessoa com até doze anos de idade incompletos. Estas tem prioridade « absoluta » na realização de direitos referentes à « vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária »10. Essa prioridade se dá à partir da noção de que as crianças são « pessoas em desenvolvimento »11 e que por isso precisam de especial proteção da sociedade (seja sob a forma de poder familiar, seja através da tutela do Estado).

34Dados do RMS (Relatório Mundial da Saúde, 2002) sobre a saúde mental infantil preveem que 10-20 % das crianças apresentem problemas mentais. As ações que guiam a saúde mental infantil envolvem discursos de intervenção em nome de um caráter vital : Busca-se impedir a morte por suicídio ou a melhora « qualidade de vida ». Desse modo entendemos que estejam vinculadas a regimes de « biopoder » (Rabinow e Rose, 2006, p. 29) ; regimes que envolvem uma configuração qualitativa entre poder, subjetividade e conhecimento, sob um modelo de compreensão biologizante (do sistema biomédico) do ser humano. As políticas em saúde mental infantil também fornecem modelos para o normal e patológico. Neste caso indaga-se sobre as concepções das crianças « deprimidas » e suas famílias acerca do que represente uma « infância normal » e em que termos apresentam o mal-estar. Também é importante que se observe quais as relações sociais incluídas nessa temática, que normalmente não são consideradas relacionadas ao sofrimento na infância.

35Historicamente, a criança só passou a ser entendida como um sujeito singular na sociedade, recentemente. Segundo Ariès (1978 [1981]) este é um conceito que foi estabelecido a partir de algumas ideologias instituídas, como a igreja católica no final da idade média e, modernamente, por médicos, educadores, filósofos e psicólogos. Neste período o autor enumera dois modelos de infância : no séculos XVI e XVII a criança era vista como um « adulto em miniatura », pois o tratamento dispensado a estas era igual ao dos adultos. Modernamente a criança passa a ser entendida como um « ser em formação », e por isso há um investimento social neste sentido.

36Na antropologia a criança foi muito tempo ignorada enquanto objeto social. Tassinari (2007) explica que isso ocorreu porque os antropólogos já chegavam em campo com uma concepção de infância pré-definida, na qual a criança é mero objeto da socialização dos adultos. Essa ideia da criança como « vir-a-ser » (Tassinari, 2007, p. 12) é compatível com os valores identificados em Ariès onde o adulto é o modelo de pessoa completa e único agente cultural, e a criança é um « ser em formação ». Essas acepções impediram a observação de como as crianças podem ser agentes da cultura e autores da conformação cultural (Cohn, 2005).

37Em Ariès observamos que a ideia de família foi condição de um sujeito infantil, na medida em que teve como objeto principal se ocupar moral e espiritualmente destes. Esse marco histórico nos enfatiza como o sentimento de família e o sentimento de infância se confundem (Ariès, (1978 [1981]). Sendo assim concorda-se com Cohn (2000, 2013) que um estudo que se concentre nas crianças precisa levar em conta a relação da noção de infância, com outras categorias conceituais como a noção de família e de pessoa.

38Os estudos de Fonseca (2002) na área de família em classes populares brasileiras são uma importante referência para refletir o binômio « noção de infância » versus configuração familiar. A tese defendida pela autora é que a família das classes trabalhadoras urbanas no Brasil têm uma noção de infância específica, quando em contraste com a ideia vigente na classe média. Assim, e enquanto na classe média a criança é considerada um « projeto » conjugal, nas « classes populares » ela é um veículo de reciprocidade com a família (principalmente a consanguínea). Neste último contexto, a criança teria como função engajar as famílias numa rotina de trocas, com uma rede social mais extensa (Fonseca, 2002, p. 33).

39Um segundo ponto a ser marcado tem relação com a especificidade já mencionada por Fonseca de diferentes ideias sobre criança em certos segmentos da sociedade. Mas vai além disso quando atenta para a necessidade de estranhamento e relativização de noções aparentemente bem estabelecidas como a criança enquanto « ser em formação ». Sobre isso exemplificamos com a nossa própria experiência de estudo na Costa da Lagoa (Florianópolis). Naquele contexto, Maluf (1993) já relatara a existência de três níveis de família (a família nuclear, a família extensa e à comunidade da Lagoa), que informava a importância das relações de « parentela e vizinhança » naquela comunidade. Nossa conclusão é que esses diferentes níveis também se refletiam na concepção de criança. Assim, embora vigorasse a noção da criança como um « ser em formação » esta não estava totalmente atrelado à concepção moderna (de um indivíduo), mas se incluía em diferentes níveis, invocados por situações pragmáticas.

40O laço comunitário diferenciado que encontramos em alguns contextos e segmentos da sociedade fez com que alguns autores defendessem uma relativização cosmológica correspondente. Paradigmático é o estudo de Duarte (1986) com classes trabalhadoras urbanas brasileiras. Neste trabalho o autor utiliza a proposta dumontiana de inversão hierárquica para propor que nas sociedades modernas a totalidade ideológica é fundada no individualismo e na igualdade, mas para as chamadas classes trabalhadoras urbanas brasileiras, segundo Duarte, seria holista e hierárquica.

41Mesmo não podendo prever de antemão de que região são as crianças pesquisadas, a recomendação de Cohn (2013) é que « a concepção de infância é algo que o antropólogo deve cuidar para não levar a campo » (Cohn, 2013, p. 232). A autora recomenda que metodologicamente a concepção de infância deva ser investigada em sua dupla faceta : a primeira voltada aos discursos, práticas e políticas que tem as crianças como alvo (a que fala « de » crianças) ; e a segunda que privilegia o ponto de vista das crianças (que fala « com » crianças) (Cohn, 2013, p. 241). Esses são como dois lados da moeda que não podem ser apreciados em conjunto mas que são complementares quando a intenção é pesquisar a concepção de infância em jogo.

Pressupostos épistemológicos de uma pesquisa com sujeitos

42Pesquisar « sobre » e « com » crianças é pressupor que as crianças não apenas reproduzem o que lhes é ensinado, mas também são produtoras culturais e de si mesmas (Pires, 2010). Essa perspectiva levada para o universo infantil visa de modo mais amplo a um rompimento com a ideia de « cultura » e « indivíduo » como entes substantivados, privilegiando a perspectiva de ambos como processo.

43Um autor que tem sido muito fértil a essa reflexão antropológica anti-essencialista tem sido Foucault. Este autor contribui para um descentramento do sujeito, desde que propõe o homem como uma invenção recente junto a uma epistême positivista (Foucault, [1966] 1992). Através do seu método genealógico procurou evidenciar as condições históricas de emergência de certas formas de subjetivação presentes e articuladas à determinadas verdades/poderes. Exemplificando, pode-se pensar que essas verdades vão desde discursos médico-científicos, religiosos, educacionais sobre o que seria uma infância normal, e as práticas que são lançadas em favor de tal normatividade. Entretanto destaca-se que as formas de subjetivação em relação aos discursos que a condicionam, são marcadas tanto pelo assujeitamento, como pela possibilidade de resistência e reinveição. Ou seja, contemplam uma faculdade criativa ([1976] 1985). Essa capacidade criativa ou de variação da norma passa por uma resistência às duas formas atuais de sujeição :

(...) uma que consiste em nos individualizar de acordo com as exigências do poder, outra que consiste em ligar cada indivíduo a uma identidade sabida e conhecida, de uma vez por todas. A luta pela subjetividade se apresenta então como direito à diferença e direito à variação, à metamorfose.  (Deleuze, [1942] 2005, p. 113).

44Além de Foucault, outra autora que tem nos ajudado a pensar possíveis caminhos metodológicos na antropologia é Toren (2002) através a perspectiva ontogenética. Essa autora diferencia-se de abordagens aparentemente similares como a antropologia cognitivista e a psicologia evolutiva, por exemplos, definindo uma noção de mente que se constitui na intersubjetividade, e privilegiando o processo de desenvolvimento – e não o ente - como objeto de análise. A abordagem microhistórica de Toren nos parece mesmo ecoar em Foucault no que leva em conta as apropriações e transformações dos discursos/práticas pelo sujeito. Em síntese, esta é uma abordagem que visa investigar : « como […] as crianças constituem de uma nova maneira as práticas e conceitos dos adultos com quem convivem » (Toren, 2002, p. 187, tradução nossa12). Nesse corolário teórico-metodológico a « ontogenia » é definida como processo pelo qual cada um corporifica a história de sua constituição. Sua sugestão é que para desenvolver tal perspectiva, deve-se pesquisar concomitantemente tanto os adultos (e suas ideias sobre o mundo), quanto como as crianças vão constituindo os conceitos e práticas utilizadas pelos mais velhos.

45Toren e Foucault possuem perspectivas que implicam uma comparação embutida. Trata-se da comparação do aprendizado, do saber e dos modos de fazer. São pontos teóricos que tiram o foco usual do indivíduo enquanto uma totalidade passível de ser separada da cultura e do social. São propostas diferentes, viáveis de apresentar relações específicas e que podem ajudar a iluminar nosso campo de estudo.

Considerações Finais

46Situado a partir de uma pesquisa no Brasil, este artigo procurou compilar contribuições teóricas para um estudo antropológico sobre o diagnóstico de depressão infantil no serviço público de saúde. Para isso fizemos uma revisão sobre os estudos antropológicos de « saúde mental » na sociedade brasileira, que desde o início reconhecem nas emoções um objeto privilegiado para uma análise política do cotidiano e das relações interpessoais.

47Levando em conta preceitos da antropologia médica, procurou-se situar a « depressão infantil » como inscrita num modelo biomédico de compreensão dos afetos (Good,1994). Retomando os pressupostos fundamentais desse sistema de conhecimento, observou-se que a principal característica da biomedicina é ser epistemologicamente centrada num determinismo biofísico, que no entanto é cientificamente discutível quando se leva em consideração a « saúde mental ». Logo, e apesar do crescente processo de medicalização da sociedade brasileira, estudos transculturais sobre a « depressão » têm revelado diferentes modos de expressão que denotam especificidades culturais desse fenômeno. Estas peculiaridades na experiência da perturbação « mental » poderiam estar presentes mesmo quando se compara diferentes grupos sociais de mesma sociedade.

48 Outra vertente teórica tomada neste estudo parte de uma crítica histórica para refletir o porquê da depressão - apesar dos recentes tratamentos farmacológicos desenvolvidos - ser um diagnóstico que não cessa de se expandir estatisticamente. Sendo assim, indaga-se esse fenômeno enquanto um marcador social do contemporâneo, que revelaria uma transformação de valores na sociedade. Entende-se principalmente que o fenômeno é parte de uma tendência (neoliberal) onde a economia engloba as demais esferas da existência e pressiona no sentido de uma compreensão do homem segundo seu caráter produtivo (Farhi Neto, 2007). A infância, historicamente entendida como uma fase vulnerável do desenvolvimento é capturada por essa lógica quando pensada como um período crucial na formação de um desempenho futuro do indivíduo. Ou ainda quando a criança é entendida a partir de seu funcionamento cerebral e não como uma mente em desenvolvimento e transformação.

49Nas políticas públicas de saúde mental infantil podemos encontrar premissas sobre o significado de uma infância normal e anormal. Uma investigação antropológica dessas políticas permitiria levantar quais relações sociais estão incluídas nessa temática (principalmente de forma implícita) bem como analisar em que termos são considerados o sofrimento na infância. Em contrapartida, estudar concomitantemente a experiência dos sujeitos que são alvos dessas políticas – as crianças e seus familiares - permitiria entender quais os constrangimentos sofrem estas mesmas políticas de baixo para cima, no processo de seu desenvolvimento.

50Um estudo antropológico que leve em conta a experiência de « sujeitos » implica uma matriz epistemológica que rompa com a ideia de « cultura » e « indivíduo » como entes substantivados. Um dos modos de desenvolver essa orientação seria resgatar as elaborações foucaultianas acerca das « formas de subjetivação » (Foucault, [1976] 1985), que compreendem a relação dialética entre os indivíduos e os discursos que os condicionam. Outros caminhos metodológicos da antropologia contemporânea emergem com Cristina Toren (2002), através da abordagem microhistórica no estudo das crianças. Esse método busca elucidar como as crianças operam uma reinvenção das práticas e conceitos inseridos em suas convivências com os adultos.

Bibliographie   

ALVES, Paulo César Rabelo, « O Discurso Sobre a Enfermidade Mental », in ALVES, Paulo César Rabelo e MINAYO, Maria Cecilia de Souza, (dir.) Saúde e doença : um olhar antropológico, Rio de Janeiro : Editora FIOCRUZ, 1994.

ANDRADE, Ana Paula Miler, Sujeitos e(m) movimentos : uma análise crítica da Reforma Psiquiatra brasileira do ponto de vista dos experientes, Tese de doutorado em Antropologia Social, UFSC, 2014.

ARIÈS, Philippe, História Social da Infância e da Família, 2 ed. Brasileira, Rio de Janeiro : Guanabara, 1981.

ASSIS, Simone Gonçalves de, Superação de dificuldades na infância e adolescência : conversando comprofissionais de saúde sobre resiliência e promoção da saúde, Rio de Janeiro : FIOCRUZ/ENSP/CLAVES/CNPq, 2006.

AZIZE, Rogério Lopes, « Uma neuro-weltanschauung ? Fisicalismo e subjetividade na divulgação de doenças e medicamentos do cérebro. »,Mana, v.14, n. 1, Rio de Janeiro : Museu Nacional, 2008, 7-30.

BAZTÁN, Ángel Aguirre, « Antropologia de la depressión. », Revista Mal-estar e Subjetividade, v. 8, n. 3, Fortaleza : Universidade de Fortaleza, 2008, 563-601.

BRASIL, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, Dispõe Sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências.

BRITO, Mirela Alves de, Entre Cobras e Lagartixas : Crianças em Instituições de acolhimento se construindo sujeitos na maquinaria da proteção integral, Tese de doutorado em Antropologia Social, UFSC, 2014.

CAPONI, Sandra, « Biopolítica e Medicalização dos Anormais », Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro : Instituto de medicina Social da UERJ, v.19, n.2, 2009, 529-549.

CASTEL, Robert, Le psychanalysme. L’ordre psychanalytique et le pouvoir, Paris : Maspero, 1973.

COHN, Clarice, « Noções sociais de infância e desenvolvimento infantil. », Cadernos de Campo, v.9, n.9, São Paulo : USP, 2000, 13-26.

COHN, Clarice, « Concepção de infância e infâncias : um estado da arte da antropologia da criança no Brasil. », Civitas, v. 13, n. 2, Porto Alegre : PUC, 2013, 221-244.

CRUVINEL, Miriam, e, BORUCHOVITCH, Evely, e, SANTOS, Acácia Aparecida Angeli dos, « Inventário de Depressão Infantil (CDI) : Análise dos Parâmetros Psicométricos. », Fractal, v. 20, n. 2, Rio de Janeiro : UFF, 2008, 473-489. 

DELEUZE, Gilles, « As dobras ou o lado de dentro do pensamento (subjetivação) », in DELEUZE, Gilles, Foucault. São Paulo : Brasiliense, 2005, 101-142.

DUARTE, Luís Fernando Dias, Da vida nervosa nas classes trabalhadoras urbanas, 2ªed. Rio de Janeiro : Jorge Zahar Editor, 1986.

DUARTE JR, João Francisco, « A ditadura da Família. », in DUARTE JR, João Francisco, A Política da Loucura : a antipsiquiatria, Papirus : Campinas, SP, 2ªed. 1953, 57-66.

DUNKER, Christian Ingo Lenz, e, KYRILLOS NETO, Fuad, « A crítica psicanalítica do DSM-IV : breve história do casamento psicopatológico entre psicanálise e psiquiatria. », in Rev. latinoam. psicopatol. fundam., v. 14, n. 4, São Paulo , 2011, 611-626.

EHRENBERG, Alain, « Depressão, doença da autonomia ? Entrevista de Alain Ehrenberg à Michel Botbol », Ágora : Estudos em Teo. Psicanalítica, v. 7, n.1, Rio de Janeiro: UFRJ, 2004.

FAHIR NETO, Leon, « Cap.V O governo segundo a racionalidade econômica. », in

Biopolítica em Foucault, Programa de Pós-Graduação em Filosofia, Dissertação de Mestrado, UFSC, 2007.

FIGUEIRA, Sérvulo, « Notas Introdutórias ao estudo das terapêuticas II: Robert Castel e Michel Foucault. », in FIGUEIRA, Sérvulo, Sociedade e Doença Mental, São Paulo: Ed. Campus, 1978, 87-140.

FONSECA, Claudia, « O que significa um filho? », in FONSECA, Claudia, Caminhos da adoção, São Paulo: Cortez, 2002, 25-42.

FOUCAULT, Michel, Microfísica do Poder, Rio de Janeiro: Edições Graal, 2014.

FOUCAULT, Michel, As Palavras e as Coisas: uma arqueologia das ciências humanas, São Paulo: Martins Fontes, 1992.

FOUCAULT, Michel,« O Cuidado de si », in FOUCAULT, Michel, Historia da sexualidade III : A Vontade de Saber, Rio de Janeiro : Graal, 1985, 45-73.

FREUD, Sigmund, « O mal-estar na civilização. », in FREUD, Sigmund, Edição Standard das Obras Completas de Sigmund Freud (vol. 21), Rio de Janeiro : Imago, 1996.

GONÇALVES, Cintia Adriana Vieira, e, MACHADO, Ana Lucia, « Depressão, o Mal do Século : De que Século ? », in Revista de Enfermagem UERJ, v.15, n.2, Rio de Janeiro, 2007, 298-304.

GOOD, Byron, « Medical anthropology and the problem of belief », in GOOD, Byron Medicine, Rationality and Experience: An anthropological perspective, Cambridge Univ. Press, 1994, p. 1-10.

JENKINS, Janis, KLEINMAN, Arthur, GOOD, Byron, « Cross-Cultural Studies on Depression », in JENKINS, Janis, KLEINMAN, Arthur, GOOD, Byron, Culture and depression: studies in the anthropology and cross-cultural psychiatry of affect and disorder, Berkley: University of California Press; 1985, 67-99.

KEHL, Maria Rita, Sobre ética e psicanálise, Companhia das letras : São Paulo, 2000.

LACAN, Jacques, « Função e Campo da Fala e da Linguagem em Psicanálise. » Escritos, Rio de Janeiro : Jorge Zahar Ed., 1998.

MALUF, Sônia Weidner, Encontros noturnos : bruxas e bruxarias na Lagoa da Conceição, Rio de Janeiro : Rosa dos Tempos, 1993.

MALUF, Sônia Weidner, « Antropologia Reversa e Nós : Alteridade e Diferença », in Ilha, v.12, n. 1. Florianópolis, 2011, 40-56.

MALUF, Sônia Weidner, TORNQUIST, Carmen Susana (dir.), Gênero, saúde e aflição : abordagens antropológicas, Florianópolis : Letras Contemporâneas, 2010.

MENÉNDEZ, Eduardo, « Modelos de atención de los padecimientos : de exclusiones teóricas y articulaciones prácticas. », in Ciência & Saúde Coletiva, v. 8, n.1, 2003, 185- 208.

MINAYO, Maria Cecília de Souza, O desafio do conhecimento. Pesquisa qualitativa em Saúde,Rio de Janeiro : Hucitec – Abrasco, 2000.

MINAYO, Maria Cecília de Souza, « Abordagem antropológica para a avaliação de políticas sociais. », in Revista de Saúde Pública, v. 25, n.3, São Paulo : USP 1991, 233-238.

MINISTÉRIO da Saúde, « Reforma Psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil », Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental : 15 anos depois de Caracas, 2005.

MOURA, Fernando, « Sapeca », « Danado », « Abobadinho », « Distante » : Considerações antropológicas sobre o distúrbio de déficit de atenção e hiperatividade a partir de entrevistas com professoras de Florianópolis, SC, Trabalho de conclusão de licenciatura apresentado ao curso de graduação em Ciências Sociais, Universidade Federal de Santa Catarina, 2014.

NAKAMURA, Eunice, DOS SANTOS, José Quirino, « Depressão Infantil : Abordagem Antropológica. », in Revista de Saúde Pública, v. 41, n.1, São Paulo : USP, 2007.

OLIVEIRA, João Pacheco, « Pluralizando tradições e etnografias : Sobre um certo mal-estar na antropologia », in Cadernos do LEME, v.1, n.1, Campina Grande : UFCG , 2009, p. 2-27.

OLIVEIRA, Roberto Cardoso, « O trabalho do antropólogo: olhar, ouvir, escrever. », in OLIVEIRA, Roberto Cardoso, O Trabalho do antropólogo, Brasília: UnB, 1998. p. 17-35.

PEREIRA, Maria Fernanda Salvadori, Gravidez, Corpo e Pessoa: A formação da criança na Costa da Lagoa (Florianópolis), Dissertação de mestrado em Antropologia Social, Universidade Federal de Santa Catarina, 2012.

PIRES, Flávia. « O que as crianças podem fazer pela antropologia. », in Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 16, n. 34, 2010, 137-157.

RABINOW, Paul e ROSE, Nikolas, « O Conceito de Biopoder Hoje », in Política & Trabalho -Revista de Ciências Sociais,n.24, João Pessoa : UFPB, 2006, 27 – 57.

ROUDINESCO, Elisabeth, « A sociedade depressiva. », in Por que a psicanálise, Rio de Janeiro : Jorge Zahar, 2000, 12-52.

RUSSO, Jane, « Uma leitura antropológica do mundo psi. », in Mnemosine, v.1, n.0, Rio de Janeiro : Instituto de Psicologia da UERJ, 2004, 38-43.

SHORE, C. « La antropologia y el estudio de la política pública : Reflexiones sobre la formulación de las políticas. », in Antípoda, n. 10, Bogotá : Univ. de los Andes, 2010, 21-49.

SILVEIRA, Maria Lúcia da, O Nervo Cala, O Nervo Fala : A Linguagem da Doença, Rio de Janeiro : Editora Fio Cruz, 2000.

TASSINARI, Antonella Imperatriz, « Concepções indígenas de infância no Brasil. », in Tellus, n.13, Campo Grande : UCDB, 2007, 11-25.

TEIXEIRA, Marco Antônio Rotta, « Melancolia e depressão : um resgate histórico conceitual na psicanálise e na psiquiatria. », in Revista de Psicologia da UNESP, v. 4, n.1, 2005, 41-56.

TOREN, Cristina, « Comparison and ontogeny », in GINGRICH, André e FOX, Richard, Anthropology, by comparison, London: Routledge, 2002, 118-203.

VELHO, Gilberto, « Duas Categorias de Acusação na Cultura Brasileira Contemporânea. », in FIGUEIRA, Sérvulo, in Sociedade e Doença Mental, São Paulo: Ed. Campus, 1978, 37-45.

VELHO, Gilberto, « Becker, Goffman e a Antropologia no Brasil. », in Sociologia, Problemas e Práticas, n.º 38, Lisboa: Ed.Mundos Sociais, 2002, 9-17.

YOUNG, Alan, « Some Implications of Medical Beliefs and Practices for Social Anthropology. », in American Anthropologist, v. 7, n. 1, 1976, 5-24.

WEDEL, Janine, SHORE, Cris, FELDMAN, Gregory, LATHROP, Stacy, « Toward an Anthropology of Public Policy. », in TheAnnals of the American Academy of Political and Social Science, 2005.

WORLD Health Organization, Relatório Mundial da Saúde. Saúde Mental : Nova Concepção, Nova Esperança, Lisboa, Ministério da Saúde, 2002.

WORLD Health Organization, Centro de mídia, « Depressão », Ficha n. 369, outubro, 2012. Disponível em http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs369/en/

Notes   

1  CASTEL, Robert, Le psychanalysme. L’ordre psychanalytique et le pouvoir, Paris : Maspero, 1973.

2  Traité des dégénérescences physiques, intellectuelles et morales de l´espèce humaine.

3  Bicho de Sete Cabeças é um filme de dramabrasileiro de 2000 dirigido por Laís Bodanzky baseado no livro autobiográfico de Austregésilo Carrano Bueno, Canto dos Malditos. O filme conta a história de um jovem que é internado em um hospital psiquiátrico após seu pai, com o qual mantém uma relação conflituosa, descobrir um cigarro de maconha em seu casaco. Durante a internação o protagonista é submetido a situações abusivas.

4  Dados da conferência de reforma dos serviços saúde mental (2005)

5 Ibid

6  WHO - World Health Organization: Centro de mídia. Depressão. Ficha n. 369, outubro, 2012. Disponível em http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs369/en/

7  Segundo Freud na obra Mal Estar na Civilização (1930), a cultura está no cerne da constituição psíquica, engendrando os diferentes sintomas neuróticos. Essa relação com a cultura foi atualizada por Lacan (1998), quando propõe uma ordem simbólica em forma de linguagem que é anterior e constituinte do sujeito.

8  Conceito Foucaultiano que remete a uma tecnologia de poder aplicada à vida do homem- espécie.

9  A partir da década de 60, segundo a psiquiatra Mirian Cruvinel (2014).

10  ECA (1990), Art. 4º.

11  ECA (1990), Art 6º.

12 « How [...] children constitute anew the practices and concepts of the adults alongside whom they live their lives »

Citation   

Maria Fernanda Salvadori PEREIRA, «Apontamentos teóricos para uma investigação antropológica da « depressão infantil » no serviço público de saúde do Brasil», Cultures-Kairós [En ligne], paru dans Les numéros, mis à  jour le : 08/09/2015, URL : https://revues.mshparisnord.fr:443/cultureskairos/index.php?id=1094.

Auteur   

Quelques mots à propos de :  Maria Fernanda Salvadori PEREIRA

                                     Maria Fernanda Salvadori PEREIRA est titulaire d’un Master en anthropologie sociale, et doctorante – boursière CAPES – en anthropologie sociale à l’Universidade Federal de Santa Catarina. Depuis 2010, elle participe au groupe de recherches « Trânsitos Contemporâneos » qui développe des travaux dans les domaines du genre, de la santé et des modes de subjectivation contemporains.                                                                              Master en Antropologia Social. Universidade Federal de Santa Catarina (Brasil), pesquisadora bolsista CAPES de pós-graduação. Doutoranda em Antropologia Social pela Universidade Federal de Santa Catarina, participa desde 2010, do grupo de pesquisa « Trânsitos Contemporâneos » que desenvolve pesquisas na área de gênero, saúde e modos de subjetivação contemporâneos.