Artes e culturas indígenas : pensamentos desde museus ultramarIndigenous arts and cultures: reflections from overseas museums
André Fernando BaniwaDOI : https://dx.doi.org/10.56698/cultureskairos.2091
Résumés
Résumé
La visite de plusieurs musées français et la réalisation d’un travail de recherche dans des collections ethnographiques de l’Amazonie, ont été une opportunité pour alimenter ma réflexion sur la reconnaissance des arts et des cultures autochtones dans les institutions muséales. La pensée occidentale comprend l’art de manière réductrice, classant les réalisations et artefacts amérindiens comme des objets sans vie et sans histoire. Il faut multiplier les expériences de partenariats avec des chercheurs autochtones pour revisiter les patrimoines des musées et renforcer le respect mutuel entre nos savoirs.
Abstract
The visit of some French museums and the realization of a research work in ethnographic collections from Amazon, were opportunities to reflect on the recognition of native arts and cultures in the museal institutions. Western thought understands art in a reductive way, classifying indigenous artefacts as objects without life and without history. We must multiply the experiences of partnerships with indigenous researchers to revisit the heritage of the museums and strengthen the mutual respect between our two forms of knowledge.
Resumo
A visita de vários museus franceses e a realização de um trabalho de pesquisa em coleções etnográficas da Amazônia, foram oportunidade para alimentar minha reflexão sobre o reconhecimento das artes e culturas indígenas nas instituições museais. O pensamento ocidental entende arte de uma forma redutora classificando as confecções indígenas em objetos sem vida e sem história. E preciso multiplicar as experiências de parcerias com pesquisadores indígenas para revisitar os patrimônios dos museus e fortalecer um respeito mútuo dos conhecimentos.
Index
Index de mots-clés : collections ethnographiques, art Baniwa, musée d’art, partenariats.Index by keyword : ethnographic collections, Baniwa art, art museum, partnerships.
Texte intégral
1As Culturas Indígenas são artes indígenas e Artes Indígenas são culturas indígenas. Esta reflexão é muito importante para entender a questão de Artes e Culturas indígenas nos museus e é inspirada dos contatos que tive com peças indígenas guardadas nos museus da França em junho de 20181. Considero importante refletirmos sobre a importância de qualquer trabalho-arte em nossas vidas, na vida do nosso povo em específico mas também na vida nacional e na vida em termos globais. Percebo que os objetos que estão nos museus são tratados como cultura material, que são artesanatos, são utensílios domésticos, materiais de caça, materiais de pesca... porém todos são resultados de conhecimentos aplicados em material ou seja que em outras palavras são artes, e vida.
2Arte é resultado de um conhecimento, resultado de um processo, e o processo é um tempo determinado, dentro da qual sofreu transformação uma matéria-prima. Arte precisa tempo. O fim de um processo é Obra-arte sofisticada de origens culturais, que na verdade representam um sistema de vida, a cultura indígena. A cultura indígena é fundamental para a vida dos objetos, suas identidades e suas tecnologias baseadas nos conhecimentos milenares. Todos fazem parte de um conjunto de conhecimentos incluindo técnicas, gestos, palavras e matéria-prima nos seus ambientes, que exigem de uma boa gestão relacionados aos territórios indígenas poucos conhecidos pelos mundos não indígenas.
3Em visita aos museus da França, em Paris e Toulouse diziam os museólogas e museólogos que antes as peças indígenas não faziam parte dos museus de artes. Segundo estes especialistas de certo tempo pra cá, as coisas mudam na França. Um presidente reformulou a política para incluir objetos ou cultura material indígenas chamando-as também de artes. Por isso são expostos em museus ou em reservas técnicas como artes indígenas : os chamados simplesmente objetos, materiais ou peças receberam nome na França nos museus como Artes.
4No ano 2000, quando o Brasil completava e comemorava 500 anos, o povo Baniwa decidiu em uma oficina de mestres artesãos, não chamar mais só de “artesanato” suas produções culturais de cestaria de arumã, mas sim de “arte”. Assim surgiu “Arte Baniwa”. A marca Arte Baniwa, primeira grife indígena no Brasil, representa os objetos, materiais culturais ou peças que são produzidos para comercialização. A experiência do povo Baniwa com seus produtos culturais promoveu os conhecimentos e as criações indígenas com sua valorização no mercado de decoração com grafismos milenares. Ganhou vários prêmios nacionais e assim promoveu vários debates inspirando outras iniciativas2. Por isso é muito importante a França reconhecer como arte as produções indígenas que guarda nos seus museus.
5A minha reflexão vai mais além. Para nós indígenas, um objeto, um material, uma peça envolvem conhecimento e uma relação especifica com a natureza. Por isso diria que os objetos são muito mais que simplesmente artes. A arte contempla bem estes conhecimentos em objetos, mas o conceito atual de arte fora do contexto indígena ainda fica longe do sentido indígena de arte. Os objetos são mas que conhecimento e criação, eles representam identidades de povos, são também ecologia, tecnologias ecológicas, biotecnologias, formas de pensar o mundo : eles falam de nós e nós falamos deles. Por isso mesmos temos defendido durante a nossa visita em museus, durante debates, apresentações e avaliações que estas artes indígenas dormidas nos museus precisam ganhar novamente a vida.
6Ganhar vida significa deixar que estes objetos indígenas, através do seu “ser” de arte, falem melhor por nós, sobre nossas histórias, nossos conhecimentos. Para isso é necessário parcerias que envolvessem os detentores de conhecimentos, os artistas de confecções, seus líderes como mestres artesãos, os pesquisadores indígenas e os biotecnológicos tradicionais milenares, suas lideranças de organizações de suas comunidades. Precisamos multiplicar as experiências de trabalho em parceria. Os objetos que estão nos museus não são do passado como nos foi comentado, eles são do presente, e do futuro.
7Elas são artes e culturas indígenas exatamente porque representam a vida e a vida é contínua. Não existe uma nação, um povo sem história, e cada um conta também uma história de origem do mundo e criação da humanidade. Isto é fundamental para orientação dos povos em relação aos demais outros povos semelhantes e manejos do mundo. É a partir das diferenças entre povos e nações que podemos promover a respeitabilidade, caso contrário não se terá paz. Os povos indígenas precisam de respeito no mundo inteiro. E para lograr isso, os museus podem ser parceiros estratégicos por meio de objetos, artes indígenas. É necessário que os museus superem a forma de contar as histórias a partir das coleções etnográficas que eles possuem e que podem ser completadas, pois muitas ou quase todas estão incompletas.
8As parcerias estratégicas nesta visão podem trazer uma contribuição muito grande no sentido de impactar positivamente a imagem dos povos indígenas no mundo, de mudar os preconceitos injustos contra os povos indígenas. Penso que as parcerias deveriam ser feitas diretamente entre museus e instituições indígenas. Precisamos ir além de sermos informantes aos pesquisadores, precisamos ir além de trabalhos colaborativos em projetos de pesquisas. Precisamos ter parcerias institucionais, pois os nossos conhecimentos são tão importantes para o mundo e assim como interessa a sociedade envolvente, mas nunca aceitos as origens dos conhecimentos que se publicam, por exemplo. Está na hora de construirmos uma relação com museus e vice-versa a fim de pautar a igualdade de importâncias às ciências indígenas e ciências ocidentais.
9O mais importante caso isso acontecesse de uma forma organizada dentro destas parcerias é promover o bem viver dos povos indígenas nas comunidades e no meio da sociedade global. Seria um novo processo de si educar e educar os outros diferentes para um respeito mútuo.
André Baniwa no Museu do Quai Branly, Paris, maio 2018. ( Laure Emperaire, 2018)
Bibliographie
RICARDO, Beto ; MARTINELLI, Pedro, 2000. Arte Baniwa : cestaria de Arumã. Cidade : Instituto Sócioambiental.
BANIWA, André ; VIANNA, JJB ; FONSECA, Iubel A. (Orgs.), 2019. Bem viver e viver bem : segundo o povo Baniwa no noroeste amazônico brasileiro. Curitiba : Ed. UFPR.
Notes
1 Sou membro do projeto de pesquisa franco-brasileiro COLAM « Coleção dos outros e memorias de encontros : objetos, plantas e histórias da Amazônia » do programa OPUS Sorbonne Université que reuniu um grupo de pesquisadores indígenas e não-indígenas, brasileiros e franceses para estudar coleções amazónicas em museus da França em 2018.
2 Ver por exemplo o livro “Arte Baniwa : cestaria de Arumã” de Beto Ricardo e Pedro Martinelli, Instituto Sócioambiental, 2000. Sobre a arte e o “cuidar da vida” consultar também o livro de André Baniwa, Vianna, JJB ; Iubel Fonseca, A. (Orgs.). 2019. Bem viver e viver bem : segundo o povo Baniwa no noroeste amazônico brasileiro. Curitiba : Ed. UFPR.